A medicina nuclear envolve dois usos distintos de radioisótopos: terapia e diagnóstico. No uso terapêutico, a radiação é empregada na tentativa de curar doenças. Algumas formas de câncer, por exemplo, podem ser tratadas por radioterapia. As células do tumor cancerígeno são destruídas pelos efeitos da radiação. Embora o feixe radioativo seja apontado precisamente sobre o tumor, diversos efeitos colaterais acompanham o tratamento. As células da mucosa intestinal, por exemplo, são particularmente susceptíveis à radiação, fazendo com que os pacientes sofram de náuseas e vômitos.
![]() Fotoscan com I-131 da glândula tireóide de um paciente obeso |
Os radioisótopos também podem ser empregados com o propósito de diagnóstico, fornecendo informações sobre o tipo ou extensão da doença. O isótopo iodo-131 é usado para determinar o tamanho, forma e atividade da glândula tireóide. O paciente bebe uma solução de KI, incorporando iodo-131. O corpo concentra o iodo na tireóide. Após algum tempo, um detector de radiação varre a região da glândula e a informação é exibida, no computador, sob a forma visual. A figura é então chamada de fotoscan. O aparelho lê apenas a radiação gama, mas o I-131 também emite radiação beta. O tempo de meia-vida do I-131 é de apenas 8 minutos, o que faz com que toda a radioatividade cesse após algumas horas.
O radiosótopo ideal para uso de diagnóstico deveria possuir algumas qualidades: emitir partículas gama, pois estas tem um grande poder de penetração, e podem sair do organismo; não emitir, preferencialmente, partículas alfa ou beta; o tempo de meia-vida deve ser ideal: nem tão curto, que não possa ser detectado a tempo, nem tão longo, onde atividade ainda existiria após o diagnóstico. Felizmente, a natureza nos presenteou com um isótopo que atende a quase todas as necessidades: o tecnécio-99m, 99mTc. A letra m corresponde a metaestável: o isótopo pode perder alguma energia e se tornar estável. É isto o que ocorre: o átomo 99mTc emite uma partícula gama e se torna o átomo 99Tc, estável:
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99mTc 99Tc + g
A energia da radiação emitida pelo 99mTc é idealmente correta, e o t1/2 é de 6 horas. O isótopo é largamente empregado na varredura dos rins, fígado, bexiga, cérebro e pulmões. Este isótopo tem substituído um grande número de outros radioisótopos menos ideais, e a demanda para a produção do 99mTc é muito grande, o que tornou o seu preço bastante alto.
A tabela abaixo lista alguns isótopos comumente utililzados na medicina:
Principais radioisótopos usados na Medicina | ||
Isótopo | Principais usos | |
3H | Trítio (hidrogênio-3) | Determinação do conteúdo de água no corpo |
11C | Carbono-11 | ![]() |
14C | Carbono-14 | Ensaios de radioimunidade. |
24Na | Sódio-24 | ![]() |
32P | Fósforo-32 | Detecção de tumores oculares, câncer de pele, ou tumores pós-cirúrgicos. |
51Cr | Cromo-51 | Diagnóstico de albumina, tamanho e forma da baço, disordens gastrointestinais. |
59Fe | Ferro-59 | Mal função das juntas ósseas, dianóstico de anemias |
60Co | Cobalto-60 | Tratamento do câncer. |
67Ga | Gálio-67 | ![]() |
75Se | Selênio-75 | Varredura do pâncreas |
81mKr | Criptônio-81m | ![]() |
85Sr | Estrôncio-85 | ![]() |
99mTc | Tecnécio-99m | ![]() |
131I | Iodo-131 | ![]() |
197Hg | Mercúrio-197 |
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Tipos de radiação comumente empregados na medicina
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![]() O filme transparente fica escuro quando atingido pelo raio-X |
A radioatividade também é utilizada para fornecer imagens detalhadas de órgãos internos do corpo humano. A forma mais simples é a radiografia de raios-X: os raios passam através do corpo, mas são absorvidos mais nas regiões mais densas, como, por exemplo, nos ossos. A radiação, então, incide e impressiona uma chapa fotográfica: o filme fica escuro e opaco nas regiões atingidas pelos raios-X. Os órgãos que absorvem a radiação (e.g., ossos) protegem áreas correspondentes, no filme, contra e exposição. Com facilidade, pode-se perceber anomalias nos ossos (fraturas, descalcificação) ou nas juntas. Mesmo tecidos pouco densos podem ser visualisados por esta técnica, desde que com a introdução prévia de um contraste - qualquer material que absorva raios-X. Um dos contrastes mais utilizados é um sal de bário, que serve para contrastar regiões do trato digestivo. O paciente ingere um "leite de bário", que é uma solução aquosa do sal, antes de fazer o exame.
Hoje, técnicas mais modernas acoplam o raio-X ao computador; uma delas é tomografia computadorizada (CT), onde milhares de leituras de raio-X são obtidas, processadas, e então visualizadas em uma imagem tridimensional. Assim, a imagem obtida permite uma análise mais detalhada do problema, e permite diagnósticos mais precisos.
Outra técnica muito empregada é tomografia de emissão positrônica (PET), utilizada para medir e investigar processos dinâmicos que ocorrem no corpo, tal como o fluxo sanguíneo, ou a taxa na qual o oxigênio ou a glucose são metabolizados. As varreduras por PET computadorizadas (SPECT) são capazes de detectar pequenas anomalias cerebrais, responsáveis por ataques epilépticos, e detectar constricções em vasos sanguíneios ou tumores ocultos. A figura ao lado, por exemplo, é o resultado de uma análise de SPECT do coração, mostrando o dinamismo de seus movimentos, a sístole e a diástole. Para a leitura, é necessário a admissão prévia de compostos radioativos emissores de pósitrons - tal como o carbono-11. Este isótopo produz um pósitron por átomo, no decaimento. Um pósitron pode se combinar com um elétron (presente na matéria ordinária) e formar dois fótons, sob a forma de raios gama, que assumem direções completamente opostas.
+1e + -1e ![]() |
Detectores estão espalhados ao redor do corpo do paciente, e o processamento de todos os fótons detectados produz uma imagem tridimensional e dinâmica do órgão investigado.
A imagem por ressonância magnética nuclear (MRI) também é muito comum nos laboratórios de bioimagem. O princípio da técnica é o mesmo da do NMR, uma técnica analítica largamente empregada pelos químicos: alguns núcleos atômicos possuem momento de spin, e podem se alinhar em um campo magnético, dependendo da energia do campo. Ao se fazer uma varredura magnética (ou seja, aplica-se um campo magnético variável), os núcleos eventualmente absorvem energia para promover o seu alinhamento com o campo. A frequência da absorção depende do ambiente químico do núcleo. Em função disto, é possível se fazer um mapa de ressonância magnética do órgão, estabelecendo as diferentes regiões que correspondem aos diferentes ambientes químicos. Novamente, um computador é que processa as informações, e produz uma série de imagens tridimensionais. Além de oferecer imagens dos órgãos, também dá detalhes sobre as atividades metabólicas e fluxo sanguíneo; é útil para encontrar pequenos tumores ou obstruções sanguíneas, danos nas vértebras, problemas encefálicos, entre outros. É uma técncia moderna, e extremamente utilizada.
O custo para estas modernas técnicas de diagnóstico é ainda bastante alto, chegando a custar milhões de dólares para uma instalação relativamente simples (CT, MRI e SPECT). Para os pacientes o custo também é alto: muitos planos de saúde não cobrem exames de radioimagens. A grande vantagem é a enorme quantidade de informação fornecida pelos aparelhos, que somente seriam possíveis através de arriscadas cirurgias. Em alguns casos, estas informações não poderiam ser obtidas de nenhuma outra forma.
Original em: http://www.qmc.ufsc.br/qmcweb/artigos/nuclear/medicina.html
Um comentário:
Uma dúvida, durante os exames de diagnóstico é melhor se o tecido absorver isótopos radioativos ou isso geraria danos no tecido doente? Ando fazendo pesquisas e vi em algumas que a absorção da radioatividade facilita a formação da imagem.
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